Trabalhador afastado por doença ou acidente pode cair no chamado limbo previdenciário

Caio Prates, do Portal Previdência Total

Um dos temas mais controversos na relação patrão e empregado é o chamado limbo previdenciário. É a situação que ocorre quando o trabalhador se afasta do trabalho, por conta de uma doença ou acidente e, apesar de receber alta do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ainda não está efetivamente apto para retornar as suas atividades profissionais cotidianas. E, nestes casos, a empresa não aceita o seu retorno ao trabalho e também não paga o seu salário. Ou seja, o empregado fica sem a cobertura financeira da Previdência Social e sem sua remuneração mensal.

Segundo os especialistas em Direito Previdenciário, a legislação determina que um laudo de perito médico do INSS deve decidir quantos dias o trabalhador ficará afastado para se recuperar de uma enfermidade; inicialmente pela empresa, por um período de 15 dias, e depois pelo sistema de previdência. Mas há muitos casos em que a empresa não o considerada apto ao trabalho.

De acordo com o professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e autor de obras de Direito Previdenciário Marco Aurélio Serau Junior, o limbo previdenciário é uma situação de risco para o trabalhador, mas cada vez mais constante. “Esse problema tem se agravado nos últimos dois anos, pois o INSS vem procedendo um mutirão de revisão dos benefícios por incapacidade, com base nas Medidas Provisórias 739 e depois na 767, o chamado pente fino. E o órgão previdenciário cortou cerca de 80% dos benefícios dos segurados neste período, o que deixou muita gente no chamado limbo”, afirma.

Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), informa que o empregado que tem condições de retornar ao trabalho deve apresentar um relatório médico informando que está apto. “Pode até ser que sua aptidão seja com restrição, mas o empregador pode realocá-lo em outra atividade, se for o caso”, observa.

A especialista indica, porém, que caso o trabalhador ainda não esteja em condições de voltar às atividades rotineiras, “poderá fazer novo requerimento de auxílio-doença no INSS, entrar com recurso da decisão que cessou o benefício ou ingressar com ação judicial contra a autarquia previdenciária”.

Na visão do advogado João Badari, especialista em Direito Previdenciário do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, a empresa não deve desemparar o funcionário neste momento difícil. “A empresa deverá fazer o gerenciamento da rotina de atendimentos deste funcionário no INSS. Se for necessário, buscar a orientação de um advogado para que auxilie seu funcionário no pedido administrativo de um novo benefício previdenciário. E em caso de nova negativa, a judicialização do processo, para que um perito judicial examine o trabalhador e determine, se for o caso, o recebimento do auxílio da Previdência Social”.

Badari ressalta que a Justiça do Trabalho tem entendimento de que a empresa não pode deixar de pagar as remunerações de seu funcionário. “A empresa deve fazer o pagamento de seus salários e também os retroativos não pagos. Essa situação é uma lacuna na lei, por não existir legislação que resolva este problema”.

A presidente do IBDP alerta que algumas empresas não pagam o salário por entender que neste período de incapacidade do seu funcionário para o trabalho, após a alta do INSS, o contrato de trabalho está suspenso. “Algumas empresas continuam pagando o salário enquanto o processo não tem decisão, mas outras empresas entendem que o contrato está suspenso e não pagam qualquer salário ao trabalhador”.

Discussão vai aos tribunais

Os trabalhadores afetados pelo limbo previdenciário, por não terem nenhuma legislação que trate sobre o tema, têm procurado o Poder Judiciário para resolver suas questões. O professor Serau Junior afirma que a discussão judicial tem seguido dois caminhos.

“No primeiro, o segurado busca a prorrogação ou restabelecimento do benefício por incapacidade, perante o INSS e na esfera de competência da Justiça Federal. E no segundo, procura a Justiça do Trabalho para garantir a a estabilidade profissional e o pagamento de salários, bem como a própria possibilidade de exercer a atividade profissional”, afirma.

Bramante aponta que, se o trabalhador entender que está em condições de retornar ao trabalho e o patrão não permitir seu retorno, ele pode entrar com processo contra a empresa. “No entanto, convém destacar que esta atitude dependerá de a empresa ter convênio médico ou ter outros fatores cuja ação trabalhista possa vir a lhe prejudicar. Cada caso é um caso”, pondera.

Decisão recente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) classificou como ilícita a conduta de uma empresa que negou o retorno do seu funcionário após o parecer do perito médico do INSS que concedeu alta e confirmou a sua capacidade para realizar suas atividades profissionais. No caso, o ministro relator Bruno Medeiros, da Quinta Turma do TST, condenou a empresa a pagar os salários do período do limbo previdenciário, além de danos morais no valor de R$ 30 mil.

Além disso, o ministro do TST afirmou, na decisão, que a empresa não pode privar o funcionário de retornar às suas atividades e nem os pareceres de médicos privados podem restringir o retorno ao trabalho.

“O perito médico do INSS tem competência exclusiva para emissão de parecer conclusivo sobre a capacidade de retorno ao trabalho do empregado. Assim, pareceres médicos, ainda que emitidos por profissional da empresa, não têm o condão de respaldar a recusa da empresa em permitir o retorno do empregado ao seu posto de trabalho. Isso porque, embora o empregador tenha o dever de preservar a integridade física e a saúde do trabalhador, não pode privá-lo de seu direito ao recebimento de salário. Dessa forma, a conduta da empresa, ao impedir o retorno do empregado à atividade laboral e, consequentemente, inviabilizar o percebimento da contraprestação pecuniária, mesmo após a alta previdenciária, se mostra ilícita, nos termos do art. 187 do Código Civil” afirmou em seu voto.

 



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