“Transição rígida, contribuição extra e idade mínima penaliza trabalhador", avaliam juristas

 
O texto da proposta da reforma da Previdência apresentada pelo Governo Bolsonaro traz mudanças significativas para todos os trabalhadores, sejam da iniciativa privada, trabalhadores rurais e servidores públicos. Especialistas em Direito Previdenciário avaliam que faltou equilíbrio a equipe econômica do Governo Federal no texto, pois as regras de transição são rígidas e a criação de uma idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres agrada ao mercado financeiro, mas não reduzirá as desigualdades sociais.
 
“A reforma proposta pelo Governo certamente agradou ao mercado financeiro, já que atende aos anseios econômicos. Por outro lado, não é socialmente justa, uma vez que se distancia do alcançável, pois, por exemplo, impõe aos homens idade mínima excessiva de 65 anos de idade, quando a expectativa de vida é de 73 anos. Um dos objetivos da reforma da previdência é acabar com as chamadas aposentadorias precoces, que ocorrem até mesmo antes dos 50 anos de idade. Essas aposentadorias não são uma regra. Mas, o Governo não encontrou um ponto de equilíbrio, pois, considerando a expectativa de vida, o tempo de desemprego e as condições econômicas de um país subdesenvolvido, apenas uma minoria elitizada é que continuará a conseguir a aposentadoria”, analisa o advogado Erick Magalhães, sócio do Magalhães & Moreno Advogados.
 
O especialista ressalta também que, além de não ter encontrado o ponto de equilíbrio, o texto proposto “não reduzirá as desigualdades sociais, já que muitas pessoas de classes econômicas de baixa renda dificilmente conseguirão cumprir com os requisitos”.
 
Na ótica de Leandro Madureira, especialista em Direito Previdenciário e sócio do Mauro Menezes & Advogados, todos os cidadãos, sejam eles servidores públicos, trabalhadores rurais ou trabalhadores da inciativa privada, terão regras mais rígidas caso a reforma seja aprovada, mas que o Congresso poderá modificar alguns pontos da atual proposta. “Como o processo legislativo é denso e complexo, a proposta de reforma da previdência é suscetível a diversas mudanças, mas é necessário que o Congresso rechace a possibilidade de transferir ao trabalhador a responsabilidade pelo déficit da previdência dos regimes próprios e que combata à instituição de um modelo privatizado de previdência, cujas experiências internacionais demonstraram grande fracasso”, afirma.
 
O advogado especializado em Direito Previdenciário, João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, afirma que ao estabelecer uma idade mínima o Governo acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição. “A proposta do governo é um retrocesso social, pois de forma indireta acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição, um direito já adquirido e conquistado pelo trabalhador brasileiro que contribui mensalmente com a Previdência Social. Caso seja aprovada a fixação da idade mínima em 65 anos para homens e 62 para mulheres, o trabalhador terá que contribuir por cerca de 50, 40 anos até conseguir atingir o direito de se aposentar”.
 
Badari alega que os mais pobres serão os mais prejudicados. “Por necessidade, eles começam a trabalhar mais cedo e, assim, terão que contribuir pela vida inteira para poder desfrutar da aposentadoria por pouco tempo. Alguns deles sequer vão conseguir se aposentar. O trabalhador que entra no mercado de trabalho com 16 anos terá, por exemplo, que contribuir por 49 anos para o INSS para ter direito a dar entrada em sua aposentadoria”, explica.
 
O advogado Ruslan Stuchi, do Stuchi Advogados, concorda e reforça que os segurados de baixa renda, além dos trabalhadores braçais e das áreas rurais, devem ser os mais prejudicados. “Vale destacar que em diversas regiões do país a expectativa de vida não atinge os 60 anos de idade, principalmente, nas periferias. Então muitos trabalhadores irão morrer sem poder desfrutar da aposentadoria. Essa proposta não leva em consideração a justiça social e a realidade do trabalhador brasileiro”, diz.
 
Badari também acredita que o tempo mínimo de contribuição de 30 anos para professores é desumano. “Outro ponto negativo a mesma idade mínima de 60 anos para professores e professoras e trabalhadores e trabalhadoras rurais, são profissionais que atuam em atividades especiais merecem uma atenção diferente. E nesse caso faltou a diferenciação de idade mínima entre homem e mulher. Nesses caso cresceram o número de afastamentos de profissionais que dificilmente aguentarão 30 ano sem salas de aula ou expostos so sol, frio e chuvas no campo. São atividades extremamente penosas. Precisa ser revisto no Congresso”, avalia.
 
Servidores também terão regras duras
 
O advogado Leandro Madureira, sócio do Mauro Menezes & Advogados, avalia que as novas regras para os servidores públicos foram severas. “Importante ressaltar que as alterações propostas ao Congresso Nacional são absolutamente perversas e modifica profundamente o sistema previdenciário brasileiro”, adverte.
 
Os pontos que merecem críticas, segundo o advogado, são: a criação de uma contribuição extraordinária para o equacionamento de déficit de regimes próprios de previdência de servidores; a criação do regime de capitalização individual, gerido por uma multiplicidade de instituições privadas e públicas, sem qualquer garantia de benefício além do salário mínimo; as contribuições obrigatórias e a idade mínima de 60 anos para trabalhadores rurais e as dificuldades impostas ao acesso do benefício assistencial, o BPC-LOAS.
 
Pela nova previdência de Bolsonaro, os servidores públicos terão regras diferenciadas e bem mais complexas do que aquelas propostas pelo governo Temer. Para servidores que ingressaram até 2003 no serviço público, o direito de paridade e integralidade somente será respeitado caso ele complete os seguintes requisitos mínimos: 35 anos de contribuição (homens), 30 anos de contribuição (mulheres), 20 anos de serviço público e dez anos no cargo em que se der a aposentadoria, além da idade mínima de 62 anos para as mulheres e 65 anos para os homens. Os professores e professoras do regime próprio têm a idade mínima de 60 anos nessa hipótese.
 
“A regra de transição para o servidor também prevê um escalonamento da idade mínima.  E os critérios são: idade mínima de 61 anos para homens e 56 anos para mulheres (em 2019), 35 anos de contribuição para homens e 30 anos para mulheres, 20 anos de contribuição, 10 anos no serviço público, cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria e o atingimento do somatório 86/96 também escalonado de acordo com o passar dos anos. Nesse caso, esse servidor terá direito a um benefício calculado de acordo com a sua média de contribuições, onde se aplicará o percentual de 60% , caso ele possua ao menos 20 anos de contribuição, acrescidos de 2% para cada ano além desse mínimo que ele possuir. Por exemplo, um servidor que se aposentar com 30 anos de contribuição, terá 20% além do mínimo, totalizando 80% sobre a média de suas contribuições. Para atingir os 100%, o servidor terá que trabalhar por 40 anos, caso contrário ele não atingirá o percentual máximo”, explica Madureira.
 
A aposentadoria por invalidez e a pensão por morte para servidores e trabalhadores vinculados ao INSS também tiveram mudanças significativas. A aposentadoria por invalidez será calculada com base em um valor mínimo de 60% da média de salários de contribuição, se esse trabalhador tiver até 20 anos de contribuição. Por exemplo, se o servidor tiver 10 anos de contribuição e tiver algum tipo de problema de saúde que provoque sua invalidez, ele terá um benefício de 60% sobre os salários de contribuição. Já para aqueles que tenham mais de 20 anos de contribuição, será acrescido o percentual de 2% para cada ano adicional de contribuição.
 
Entretanto, em caso de invalidez provocada por acidente de trabalho ou doença profissional e ocupacional, o servidor não terá limitação e receberá 100%  da média de salários de contribuição.
 
Já a pensão por morte, pela nova proposta, será de 60% do valor do benefício, acrescido de 10% para cada dependente que o servidor falecido deixar.
 
Além disso, estão previstas alterações substanciais sobre a cumulação de benefícios. Caso o servidor tenha dois ou mais benefícios de naturezas distintas, ele vai preservar a totalidade do benefício de maior valor, mas perceberá somente um percentual sobre o outro benefício. Por exemplo, se ele recebe uma aposentadoria de R$ 5 mil e se torna viúvo, somente terá direito a receber uma pensão por morte, cumulando ambos os benefícios, se a pensão for inferior ao valor de 4 salários mínimos. Se a pensão for  de três a quatro salários, ele poderá cumular o maior benefício mais 20% do benefício menor. Caso a pensão seja de dois a três salários mínimos, ele poderá cumular 40%. Já se a pensão for de um a dois salários, o servidor poderá cumular 60% do menor, E, por fim, se a pensão for de até um salário mínimo, o servidor poderá cumular até 80% do valor.
 
Segurados devem ter calma
 
O advogado Murilo Aith, sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados, recomenda cautela aos segurados do INSS que já atingiram os critérios necessários para dar entrada na aposentadoria, pois eles têm direitos adquiridos e devem procurar um especialista para fazer os cálculos e tomar uma decisão coerente sobre a possibilidade receber um bom benefício.
 
“O momento não para desespero. A proposta ainda será avaliada nas comissões da Câmara dos Deputados, antes da votação em plenário. E caso aprovada na Câmara, ainda tramitara no Senado. O caminho é longo e o texto poderá sofrer alterações.  O segurado deve avaliar se já atingiu a idade e o tempo de contribuição necessários para receber a aposentadoria no seu valor integral. Caso não tenha atingido esses critérios, o trabalhador poderá sofre com a incidência do fator previdenciário, que poderá ser prejudicial, pois em alguns casos o valor do benefício é reduzido em 30% ou 40 %.”, explica Aith. 


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