Segurado que está na fila do INSS tem direito ao pagamento retroativo

 
Arthur Gandini, do Portal Previdência Total
 
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) acumula atualmente 1,3 milhão de pedidos de aposentadoria e de benefícios, conforme números divulgados pela autarquia federal. E essa fila poderá crescer pelo efeito coronavírus e a possível suspensão do atendimento presencial das agências da Previdência Social. A fila de benefícios se agravou com a aprovação da Reforma da Previdência, em outubro do ano passado, e o governo hoje busca reforçar a análise dos pedidos com a contratação temporária de servidores aposentados.
 
Segundo o INSS, o número de benefícios represados no mês de dezembro era de 515.043. Do total, 29.537 aguardavam a análise por um período de 46 a 60 dias; 102.956, de 61 a 120 dias; e 183.457, de 121 a 240 dias. Contudo, os números têm sido contestados pela Procuradoria da República no Distrito Federal, em ação pública em andamento na Justiça Federal da 1ª Região, e podem ser maiores. 
 
O número de pedidos junto à autarquia bateu recorde em setembro do ano passado ao ultrapassar a marca de um milhão de requerimentos. O período, às vésperas da reforma da Previdência, registrou um total de 1.150.953 pedidos, o que representou aumento de 15,46% em relação ao mês anterior.
 
De acordo com especialistas, em meio à continuidade das filas do INSS e à demora para receber a resposta em relação aos benefícios, o que muitos segurados não sabem é que há regras para a análise de seus direitos. Os benefícios são devidos desde que foi dada a entrada com o requerimento e devem ser pagos de forma retroativa e corrigidos pela inflação, sem que seja preciso esperar por autorização da Justiça. A morosidade da análise pode render também indenização, o que vem sendo garantido pelo Poder Judiciário e pode ser estabelecido em lei por um projeto que tramita no Congresso Nacional.
 
“Existe a possibilidade de os segurados ingressarem com uma ação de indenização por danos morais, que será analisado caso a caso”, explica Rafael Jacopi, advogado previdenciário do escritório Stuchi Advogados.
 
O advogado menciona o Projeto de Lei (PL) 5763/19, que atualmente aguarda a designação de um relator na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF). “O projeto obriga o INSS a indenizar segurados que estão com atraso nos pagamentos. Soma-se, também, a previsão de que a autarquia deverá pagar indenização quando demonstrado que houve falha na prestação do serviço, o que se aplica neste caso em questão, onde claramente estamos diante de uma falha da autarquia federal”, afirma.
 
A lei prevê que os pedidos sejam analisados em um prazo de até 45 dias. No ano passado, o tempo médio de espera para a concessão de um benefício foi de 74 dias – chegou a alcançar 89 dias em julho e terminou o ano, em dezembro, com 75. Em 2018, o tempo médio do ano foi de 51 dias; em 2017, de 54; em 2016, de 60; e em 2015, de 39 dias.
 
João Badari, especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, afirma que muitos segurados têm optado por entrar com mandados de segurança na Justiça, instrumentos jurídicos que, caso deferidos, obrigam a autarquia a fazer a análise com o intuito de garantir o direito. 
 
Entretanto, segundo o especialista, os mandados não têm funcionado na prática. “Concluída a instrução do processo administrativo, o INSS tem até 30 dias para decidir o pedido, se defere ou não o benefício. Este prazo pode ser prorrogado por mais 30 dias, desde que a prorrogação seja fundamentada. Entretanto, não gosto da opção de mandado, pois o número de servidores é reduzido. A aplicação prática não vai trazer (solução), pois não há servidores suficientes para analisar a quantidade de benefícios”, avalia.
 
Outra situação enfrentada é quando os pedidos são analisados dentro do tempo previsto em lei, mas há demora no pagamento. Neste caso, é necessário aguardar a autorização da Justiça para o recebimento dos atrasados. Os valores começam a ser atualizados pela inflação após o seu pagamento administrativo passar do prazo de 45 dias e não sofrem incidência de juros. 
 
Há dois caminhos neste caso. O primeiro é a chamada Requisição de Pequeno Valor (RPV), quando o montante é inferior a 60 salários mínimos, e o pagamento é feito em até 60 dias da sua liberação pela Justiça. O segundo caminho são os precatórios, quando os valores são superiores a 60 salários mínimos, e que são pagos anualmente. Em 2020, serão pagos os precatórios que tenham sido autorizados entre 2 de julho de 2018 e 1º de julho de 2019.
 
Análise e soluções
 
De acordo com o advogado previdenciário Rafael Jacopi, a pensão por morte e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para idosos e deficientes são os benefícios que mais demoram para ser analisados. “Há casos em que os dependentes do segurado falecido demoram um ano para começar a receber a pensão. E, em janeiro, 475 mil pedidos do BPC aguardavam análise, sendo 420 mil há mais de 45 dias”, afirma.
 
Outros benefícios, ainda citados por especialistas, são a aposentadoria rural, e que é aberto um cumprimento de exigência por parte do segurado em razão da documentação deficitária; a aposentadoria especial, em razão da necessidade de análise mais complexa de documentação e possível cumprimento de exigência; e benefícios por incapacidade, que dependem da demora na fila para perícias em razão da reduzida estrutura médica da autarquia e o enorme número de pedidos.
 
Leonardo Carvalho, advogado sócio da área previdenciária do escritório BVA Advogados, lembra que a demora depende de cada caso e da documentação apresentada pelo segurado. “Para os segurados que têm o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) atualizado, a análise será rápida. Casos que demoram mais tempo, em geral, envolvem reconhecimento de tempo de serviço, atualização de contribuições extemporâneas, reconhecimento de atividade especial, algum tipo de perícia no ambiente de trabalho, médica ou biopsicossocial”, pontua.
 
Para solucionar o problema da continuidade das filas, o governo federal buscou, em um primeiro momento, convocar militares da reserva para auxiliar no atendimento nas agências do INSS. Após a solução ser criticada por conta da falta de preparo dos militares, foi enviada ao Congresso Nacional, no início deste mês, a Medida Provisória (MP) 922/20, que prevê a contratação temporária de servidores civis aposentados para ajudar na diminuição das filas.
 
Na opinião de João Badari, é importante lembrar que a responsabilidade pelo problema não é do servidor da autarquia e, sim, do Estado. “São poucos servidores para atender a milhões de pedidos para a concessão de benefícios previdenciários. Uma solução seria o INSS abrir novo concurso para contratação, gerando a diminuição no atraso. Não se resolve tal situação no curto prazo, pois é uma questão estrutural, que envolve principalmente a contratação de funcionários qualificados e treinados”, defende.
 
Outro problema apontado pelos especialistas é o fato de os sistemas do INSS não terem sido atualizados desde à aprovação da Reforma da Previdência. “As novas regras entraram em vigor no dia 13 de novembro e até hoje os sistemas não foram atualizados. Dessa forma, os pedidos realizados a partir da reforma estão parados. Tivemos a greve dos servidores do Dataprev, a empresa pública responsável por atualizar o sistema, e ainda há falta de servidores. Houve um aumento na demanda somado à aposentadoria de mais de cinco mil de servidores, cumulado com a ausência de concurso público”, aponta Rafael Jacopi.
 
Para Benedito Villela, professor de Direito do Ibmec SP, o setor privado também poderia ter sido utilizado pelo governo para solucionar o problema. “A iniciativa da utilização dos militares reservistas foi uma boa medida, mas dado o trâmite burocrático, teria feito muito mais sentido a utilização de uma contratação emergencial de empresas privadas para fazer o processamento, ainda que provisório, até porque se trata de um dinheiro que voltaria para a economia, ajudando no reaquecimento e aumento do PIB”, analisa.
 


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