Número de servidores que ganham acima do teto cresceu 3,5 vezes

 
O número de funcionários públicos que ganha salários acima do teto constitucional cresceu quase 3,5 vezes nos últimos dez anos. Ao menos 13,1 mil servidores dos três poderes de todas as esferas administrativas tiveram remuneração mensal média maior que o dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) no ano passado: R$ 33.763. Em 2005, apenas 3.900 receberam mais que o teto da época, de R$ 21,5 mil. As informações são dojornal O Estado de S. Paulo.
 
Os números foram tabulados pelo Estadão Dados com base nos microdados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho e Emprego. Os dados são obrigatoriamente enviados por todos os empregadores do país a cada ano e, por isso, permitem identificar o pagamento de supersalários a funcionários públicos com alto nível de detalhes.
 
Eles revelam, por exemplo, que 54 servidores públicos ganharam, em média, mais de R$ 100 mil por mês durante todo o ano passado --ou seja, três vezes mais do que o permitido pela Constituição. O maior salário registrado na base --que não identifica nem o órgão nem o nome do trabalhador-- foi o de um agente de saúde pública lotado no poder Legislativo do Pará: R$ 118 mil mensais.
 
O número total de funcionários públicos recebendo acima do permitido é provavelmente maior, por três motivos. O primeiro é que a Rais só registra servidores da ativa, e boa parte dos maiores salários vai para aposentados que acumularam gratificações e adicionais ao longo da carreira. Além disso, este levantamento leva em conta apenas o teto do funcionalismo federal, que é maior que os tetos estaduais e municipais.
 
Por último, a Rais não registra uma série de artifícios usados para justificar pagamentos acima do teto. Entram nesse rol, por exemplo, o auxílio-moradia, auxílio-livro, auxílio-saúde e outras verbas pagas a juízes e promotores, que chegam a custar mais de R$ 4.000 mensais.
 
A explosão nos supersalários aconteceu, curiosamente, em um período marcado por embates jurídicos para barrar esses pagamentos. O principal ator nesse processo foi o STF, que considerou, em 2008, que toda vantagem pessoal entra no limite do teto e, em 2014, que até servidores que recebiam supersalários antes de 1988 devem ter o excedente cortado.
 
Judiciário dos Estados concentra supersalários
 
Os dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) mostram que o maior número de servidores públicos ganhando supersalários está nos Judiciários estaduais. No total, esse poder registrou 3.041 funcionários recebendo remuneração mensal média acima do teto do funcionalismo público no Brasil em 2015 --ou seja, quase um entre quatro servidores que recebiam mais que o permitido pela Constituição estava em algum Judiciário estadual.
 
Em segundo e terceiro lugares estão os Executivos federal e estaduais, com cerca de 2.500 funcionários recebendo supersalários. Esses dois entes administrativos, porém, têm um número de funcionários na ativa muito maior que os Judiciários. Em 2015, a União registrou 514 mil servidores que mantiveram seu vínculo empregatício ao longo do ano, enquanto os Executivos dos Estados empregaram mais de 2,5 milhões de pessoas.
 
Os Judiciários estaduais, por sua vez, registraram 170 mil funcionários, segundo a Rais --ou seja, quase dois entre cada cem funcionários desse poder receberam acima do teto constitucional no ano passado. Essa proporção bate o recorde no Rio de Janeiro (7,5%), que também é o Estado que concentra o maior número absoluto de supersalários entre os Judiciários. Houve 1.521 juízes, procuradores e promotores com salário acima de R$ 33.763 - o que representa mais da metade de todos os servidores com vencimentos acima do teto nos Judiciários estaduais.
 
Marajás
 
Quando se analisa só os maiores salários mensais médios registrados no ano passado, porém, o destaque é para o poder Legislativo do Pará. Dois agentes de saúde pública, um assistente administrativo e três dirigentes de órgão lideram o ranking dos supersalários entre funcionários públicos no ano passado. Eles receberam remuneração média entre R$ 114 mil e R$ 118 mil mensais em 2015.
 
Como a Rais não identifica o órgão ou o nome do funcionário, é impossível saber se eles estão registrados na Assembleia Legislativa ou no Tribunal de Contas do Estado (TCE). O primeiro nega que eles estejam em seus quadros com os valores e cargos citados. 
 
O TCE afirmou que não paga supersalários, apesar de admitir que há casos que extrapolam o limite legal "concedidos por meio de decisões judiciais". O órgão não explicou que decisões judiciais foram essas nem se elas têm a ver com os seis servidores beneficiados com supersalários.
 
O procurador de Justiça Nelson Medrado disse ter ingressado, entre 2012 e 2013, com ações judiciais contra a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas para que ambos aplicassem o redutor constitucional nos salários. "Eles estão fazendo isso, mas se tem esses seis supersalários, num desses dois órgãos ou em qualquer outro do Pará, o jornal vai me ajudar muito a ir em cima para saber quem está recebendo isso e fazer devolver o que recebeu a mais."
 
Corrupção
 
São decisões judiciais como essas informadas pelo TCE do Pará as responsáveis por boa parte dos supersalários pagos na administração pública brasileira. Outros ainda existem só porque não houve ação judicial ou administrativa para impedir seu recebimento.
 
Recentemente, defensores da redução dessas remunerações estão tentando enquadrar o debate usando termos mais pejorativos para descrever os supersalários. A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), relatora da comissão especial criada no Senado para fiscalizar contracheques acima do salário dos ministros do STF, chegou a afirmar que "receber salário indevido também é corrupção".
 


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