Novo fator previdenciário indica que trabalhador brasileiro deverá se aposentar mais tarde

 
Caio Prates, do Portal Previdência Total
 
O brasileiro que pretende se aposentar com o benefício integral terá que passar mais tempo no mercado de trabalho. Apesar da reforma da Previdência ainda não ter sido discutida no Legislativo, os novos dados da expectativa de vida do brasileiro indicam que, para evitar um desconto maior no valor da aposentadoria por tempo de contribuição, o empregado terá que passar mais algum tempo em atividade.
 
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2015, a esperança de vida ao nascer no país era de 75 anos, cinco meses e 26 dias. O levantamento divulgado na última quinta-feira (1º) revelou o aumento de três meses e 14 dias em relação à expectativa para os nascidos em 2014.
 
As projeções do IBGE mostram que a expectativa de vida ao nascer cresce a cada ano. De 2014 para 2015 subiu de 75,2 anos para 75,5 anos de idade. Para a população masculina, passou de 71,6 anos para 71,9 anos; para as mulheres, de 78,8 anos para 79,1 anos.
 
E essa estatística reflete diretamente na aposentadoria do trabalhador brasileiro que contribui para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Isso porque os dados das Tábuas Completas de Mortalidade do Brasil do IBGE são usados pela Previdência Social como um dos parâmetros para determinar o fator previdenciário no cálculo das aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social.
 
Os especialistas reforçam que o aumento da esperança de vida afeta o bolso dos trabalhadores brasileiros. Quando a expectativa de vida aumenta, maior é o desconto do fator previdenciário nas aposentadorias, ou seja, menor é o valor do benefício. 
 
De acordo com os novos dados do IBGE, os homens entre 50 e 59 anos de idade precisarão trabalhar 62 dias a mais para ter o mesmo valor de aposentadoria, na comparação com um benefício solicitado até o mês passado. Para mulheres de 45 a 54 anos, o período aumentou em 73 dias, segundo a Conde Consultoria Atuarial. O novo cálculo aumenta em 0,64% o desconto na média salarial dos segurados que pedirem aposentadoria a partir dos 50 anos de idade.
 
O professor e autor de obras de Direito Previdenciário Wladimir Novaes Martinez explica que o fator previdenciário é um número apurado com base na idade, tempo de contribuição e expectativa de vida do trabalhador no momento do cálculo da mensalidade do benefício. “Ele restabelece uma correlatividade individual numérica e direta (sem solidariedade social) entre as contribuições mensais vertidas pelo segurado, desde julho de 1994 até a data do requerimento da aposentadoria por tempo de contribuição, e o valor da renda mensal inicial do benefício”, pontua.
 
Martinez reforça que o segurado do INSS que contribuiu por mais tempo e tem mais idade terá um benefício maior do que quem pagou menos tempo ou é mais jovem. “Trata-se de um raciocínio matemático que é lógico, mas nem sempre nem compreendido pelas pessoas. Vale dizer, em palavras ainda mais simples: o Governo Federal não deseja que os segurados se aposentam mais cedo, pois custa mais caro”, observa.
 
O advogado João Badari, especialista em Direito Previdenciário e sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados, ressalta que o fator é utilizado somente no cálculo do valor da aposentadoria por tempo de contribuição. “Na aposentadoria por invalidez não há utilização do fator, e, na aposentadoria por idade, a fórmula é utilizada opcionalmente, apenas quando contribui para aumentar o valor do benefício”.
 
Pelas regras da aposentadoria por tempo de contribuição, se o fator for menor do que 1, haverá redução no valor do benefício. Se o fator for maior que 1, haverá acréscimo no valor e, se o fator for igual a 1, não há alteração.
 
Badari alerta que em alguns casos a incidência do fator previdenciário chega a refletir em um desconto de 30% a 40% no valor final do benefício do INSS. Ele também destaca que, apesar do novo fator previdenciário já estar em vigor, os benefícios concedidos pelo INSS até o dia 30 de novembro não devem sofrer qualquer alteração. “O novo cálculo vale apenas para aqueles que deram entrada a partir do dia 1º de dezembro, qualquer erro ou desconto superior ao calculado pode ser discutido administrativamente na autarquia previdenciária e na Justiça”, diz o advogado.
 
Gustavo Filipe Barbosa Garcia, professor e doutor em Direito pela USP, destaca que a utilização dos dados do IBGE, como uma das variáveis da fórmula de cálculo do fator, foi determinada pela Lei 9.876/1999, quando se criou o mecanismo. 
 
De acordo com Garcia, ao efeito da aplicação do fator previdenciário ao tempo de contribuição do segurado devem ser adicionados:
 
- cinco anos, quando se tratar de mulher;
 
- cinco anos, quando se tratar de professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio;
 
- dez anos, quando se tratar de professora que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
 
“Isso, de certa forma, pode amenizar as consequências da incidência do fator previdenciário no cálculo do salário de benefício no caso das mulheres, professores e professoras”, alerta.
 
Na visão do professor de Direito Previdenciário Adriano Mauss, homens e mulheres perdem com o fator previdenciário. “Embora as mulheres se aposentem com menos tempo, a lei que criou o fator previdenciário estabeleceu uma regra que aumenta o tempo de contribuição da mulher em cinco anos, então, via de regra, existe uma compensação estipulada em lei para que a mulher tenha um fator parecido com a do homem, mesmo se aposentando mais cedo. Entretanto, ambos perdem, já que a redução é muito grande. Por exemplo, um homem com 50 anos de idade e 35 anos de contribuição terá um fator previdenciário de 60% (podendo variar alguns décimos), ou seja, uma redução no valor de seu benefício de 40%”, exemplifica.
 
Reforma e extinção do fator
 
Na opinião do professor e autor de obras de Direito Previdenciário Marco Aurélio Serau Junior o fator deveria ser extinto, pois trata-se de uma norma arbitrária, que não condiz com a realidade brasileira. “A Previdência Social se relaciona muito com a questão demográfica, portanto se utiliza dos cálculos do IBGE. Entretanto, reclama-se muito desse tipo de norma aberta e da arbitrariedade com que foi formulada a tabela do IBGE. Além de significar uma simples média, trata-se de uma aproximação sem base na realidade: como comparar a expectativa de vida daqueles que vivem nos Jardins, bairro nobre paulista, com aqueles que vivem nos jardins da periferia?”, questiona.
 
Os especialistas acreditam que o fator previdenciário deixará de existir com a fixação de idade mínima de 65 anos para aposentadoria no Brasil, conforma a proposta de reforma da Previdência que deve ser apresentada nos próximos dias pela equipe econômica do presidente Michel Temer.
 
“Havendo o estabelecimento de idade mínima para aposentadoria o fator previdenciário deve cair, pois implicaria em verdadeiro bis in idem (repetição) em desfavor do segurado”, observa Serau.
 
Para o professor Gustavo Garcia, uma das tendências da reforma é de não mais se admitir a aposentadoria por tempo de contribuição sem idade mínima.
 
“Caso isso ocorra, a tendência natural seria de não haver mais a incidência do fator previdenciário, o qual deixaria de existir, deixando de fazer sentido, pois o fator previdenciário atualmente tem como principal objetivo desestimular aposentadorias por tempo de contribuição precoces, ao poder reduzir o valor do respectivo salário de benefício, o qual é utilizado para o cálculo da renda mensal desse benefício”, avalia.
 


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