Proposta que tramita no Senado pretende acabar com o chamado limbo previdenciário

 
Caio Prates, do Portal Previdência Total
 
Um dos temas mais controversos na relação patrão e empregado é o chamado limbo previdenciário. É a situação que ocorre quando o trabalhador se afasta do trabalho, por conta de uma doença ou acidente e, apesar de receber alta do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ainda não está efetivamente apto para retornar as suas atividades profissionais cotidianas. E, nestes casos, a empresa não aceita o seu retorno ao trabalho e também não paga o seu salário. Ou seja, o empregado fica sem a cobertura financeira da Previdência Social e sem sua remuneração mensal. E um projeto de lei que tramita no Senado Federal pretende dar um fim a esse problemas que aflige centenas de segurados.
 
O Projeto de Lei (PL) 2.260/2020, que pacifica a matéria, foi apresentado pelo senador Fabiano Contarato (PT-SE) e garante que se o empregador, mediante exame médico próprio, não aceitar o retorno do empregado às atividades laborais anteriormente exercidas ou não o readaptar em uma nova função, alegando que ainda persistem os motivos do afastamento, ele deverá continuar a pagar o salário integral até que o segurado seja submetido a nova perícia médica oficial por parte do INSS.
 
Segundo o senador, o empregado constitui a parte hipossuficiente do ponto de vista jurídico, merecendo, dessa forma, maior proteção legal para sua situação. Assim, ele propõe a inclusão de três parágrafos ao artigo 60, da Lei 8.213, de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. O texto do projeto prevê que, após a perícia oficial, se acatadas as alegações do empregador, serão compensados os valores pagos no período com as contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados ao empregado. E também dispõe que se a nova perícia oficial não acatar as alegações do empregador, com base em exame médico próprio, esse será responsável pelo pagamento do salário integral do período, sendo impossibilitada qualquer compensação de valores pagos no período com as contribuições incidentes na folha de salários.
 
"Esse projeto de lei é importante porque ele procura dar uma solução menos onerosa para a situação do limbo previdenciário. Ele reaviva o instituto da reabilitação profissional, pois o empregador irá para um caminho de reinserir o empregado, com o benefício cessado pelo INSS, na sua função ou em uma nova atividade. Esse é um caminho interessante, pois preserva o emprego", analisa Marco Aurélio Serau Junior, advogado, professor da UFPR e Diretor Científico do IEPREV. 
 
Segundo os especialistas em Direito Previdenciário, a legislação atual determina que um laudo de perito médico do INSS deve decidir quantos dias o trabalhador ficará afastado para se recuperar de uma enfermidade; inicialmente pela empresa, por um período de 15 dias, e depois pelo sistema de previdência. Mas há muitos casos em que a empresa não o considerada apto ao trabalho.
 
Serau Junior acredita que a nova regulamentação poderá ter uma natureza indenizatória que diminuirá o ônus da empresa. "Não haverá um custo efetivo para empresa ou ele será muito pequeno, pois esse valores serão compensados com as contribuições previdenciárias patronais, ou seja terá uma natureza indenizatória e o ônus da empresa será diminuído", explica. Isso porque no projeto de lei esta estabelecido que o empregador será integralmente ressarcido mediante compensação, à semelhança do que já ocorre com o salário-maternidade.
 
Na visão do advogado João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, é essencial que o projeto de lei avance rapidamente  no Congresso Nacional par ao amparo do trabalhador. "Encontramos milhares de casos em que o trabalhador fica sem receber nenhum dinheiro, sem conseguir colocar comida na mesa e pagar suas despesas do cotidiano", alerta.
 
Os trabalhadores afetados pelo limbo previdenciário, por não terem nenhuma legislação que trate sobre o tema, têm procurado o Poder Judiciário para resolver suas questões. O professor Serau Junior afirma que a discussão judicial tem seguido dois caminhos.
 
“No primeiro, o segurado busca a prorrogação ou restabelecimento do benefício por incapacidade, perante o INSS e na esfera de competência da Justiça Federal. E no segundo, procura a Justiça do Trabalho para garantir a a estabilidade profissional e o pagamento de salários, bem como a própria possibilidade de exercer a atividade profissional”, afirma.
 
Badari reforça que o Judiciário tem sido o único caminho. "Para garantir sua subsistência, o trabalhador tem que recorrer a Justiça, pois ele não consegue trabalhar porque a empresa entende que ele está incapaz para suas funções e o INSS entende que ele não está incapaz e cessa o pagamento do auxílio. Assim, ele fica sem receber nada. A solução tem sido a via judicial, pois a jurisprudência atual entende que a empresa que tem a responsabilidade em garantir o salário. Entretanto, existem decisões divergente, que lamentavelmente deixa esse trabalhador sem receber nada, no verdadeiro limbo", ressalta o advogado.
 
Exemplos
 
E os exemplos práticos de trabalhadores que estão no chamado limbo são aqueles que têm doenças psíquicas ou lesões que os impossibilitam temporariamente de exercerem suas funções, como lesões cervicais e dores na coluna. "Temos casos em nosso escritório em que um trabalhador está com depressão profunda, mas o INSS não atestou sua incapacidade e a empresa não liberou o seu retorno. Ele está sem receber salários e isso prejudica ainda mais sua situação financeira e psíquica. Em outro caso, temos um trabalhador que tem uma lesão cervical que o impede de exercer sua função, pois ele trabalhará numa metalúrgica e carrega materiais pesados diariamente. Ele está na mesma situação: sem receber salários da empresa e sem receber nenhum auxílio do INSS. Ambos aguardam uma decisão judicial", relara João Badari.
 
Decisão recente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-RJ) condenou a Companhia Brasileira de Distribuição ao pagamento das verbas trabalhistas devidas a uma empregada. Apesar de ter recebido alta médica, a balconista teve negado pela empresa o direito de assumir seu posto de trabalho. No entendimento do Tribunal, a empresa não pode se negar a receber a empregada que retorna ao trabalho após a mesma ser considerada apta ao labor por perícia médica do INSS, além de arcar com o pagamento salarial do período em que a empregada estava oficialmente apta ao trabalho. O relator do caso afirmou que era ônus da empresa comprovar que forneceu serviços para balconista após a alta pelo INSS. Contudo, ao analisar o conjunto de provas, o magistrado observou que a funcionária não recebeu atribuições após sua alta médica, haja vista o teor dos controles de ponto da época. 
 
Em outro caso recente, o Tribunal Superior do Trabalho decidiu que cabe ao Banco Bradesco S.A. pagar os salários de uma bancária de Porto Velho (RO) que ficou em situação de limbo jurídico-trabalhista-previdenciário após alta pelo INSS. Segundo a Corte, ainda que ela tenha sido considerada inapta pela empresa, o contrato de trabalho voltou a gerar seus efeitos após a cessação do benefício. Nesse caso, de abril a maio de 2019, a trabalhadora recebeu auxílio-doença previdenciário, em decorrência de LER/DORT, e, após a alta do INSS, fez exame médico de retorno e foi avaliada como inapta pelo banco. Ela disse que se colocou, desde junho de 2019, à disposição para retornar ao trabalho, mas, em razão do Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) que a considerara inapta, o Bradesco não a aceitava de volta. E ela teve que ingressar na Justiça para garantir alguma remuneração.
 
O relator, ministro Amaury Rodrigues, observou que a jurisprudência do TST é de que a discussão quanto ao acerto ou não da alta previdenciária não afasta o fato de que, com fim do benefício, a pessoa fica à disposição do empregador, e este, caso entenda que ela não está apta ao serviço, deve pagar os salários devidos até que possa ser reinserida no trabalho ou que o auxílio previdenciário seja estabelecido.


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