Pautas da Reforma Previdenciária de 2016
Marco Aurélio Serau Junior*
O ano de 2015 foi marcado por inúmeras reformas na legislação previdenciária brasileira, configurando verdadeira minirreforma previdenciária, a qual, entretanto, foi ausente dos debates eleitorais do pleito de 2014.
Para 2016, porém, o cenário é diverso e o Governo Federal já alardeia algumas pretensões de mudanças, especialmente com o fito de acalmar os ânimos do mercado, preocupado com um suposto déficit previdenciário.
Assim, esta coluna examina os dois prováveis principais temas sobre os quais recairá a reforma previdenciária projetada para 2016: estabelecimento de idade mínima para aposentadoria e equiparação do tempo de contribuição para aposentadoria da mulher (atualmente inferior ao exigido para o homem).
Do ponto de vista atuarial, ambas as mudanças são plenamente defensáveis. Contudo, parecem um tanto apartadas da realidade brasileira.
No caso da aposentadoria por tempo de contribuição, atualmente exigindo 30 ou 35 anos de contribuição (respectivamente para a mulher e para o homem), há uma série de propostas que pleiteiam a majoração do tempo de contribuição ou, ao revés, a introdução de idade mínima para a aposentadoria. Cogita-se algo próximo dos 70 anos, assim como recentemente introduzido em alguns países europeus.
Entretanto, não se pode esquecer que, diferentemente do que ocorre na Europa, os brasileiros, em sua grande maioria, começam a trabalhar muito cedo, muitas vezes em situação informal ou de precariedade, o que traz grandes reflexos em seus direitos previdenciários, que são bastante afetados. De outra parte, após certa idade, torna-se bastante difícil conseguir ou se manter empregado.
Esses dois elementos me preocupam bastante quando vêm à tona propostas de aumento do tempo de contribuição necessário à aposentadoria.
No caso da aposentadoria assegurada às mulheres com menor tempo de contribuição do que aquele exigido dos homens, outro objeto de provável reforma previdenciária, o tema merece cuidado ainda maior.
De fato a expectativa de vida das mulheres é notoriamente superior à dos homens, o que impõe um problema atuarial: aposentam-se mais cedo e seu benefício perdura por mais tempo, pois vivem mais do que os homens.
Porém, muitas vezes deixam o mercado de trabalho em virtude de situações familiares e conjugais; também é frequente a subremuneração em relação ao trabalho masculino. Outro complicador é a diferença geracional e a situação de classe: as mulheres de classes econômicas mais altas enfrentam menos essa situação do que aquelas de menor poder aquisitivo, assim como as gerações mais novas sofrem menos com isso do que as gerações anteriores.
Em ambas as hipóteses tratadas acima entendo que é necessário que a eventual Reforma Previdenciária seja adequada à realidade social brasileira, dotada de particularidades e nuances.
Em minha Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Direito da USP (Seguridade Social como direito fundamental material, 2ª edição, Curitiba: Juruá, 2011), ressaltei a importância de refletir sobre as instituições previdenciárias sem a utilização de categorias universais ou abstratas, como se houvesse um padrão previdenciário aplicável indistintamente à Europa, aos Estados Unidos e à América Latina.
Esses temas são dos mais relevantes para a sociedade brasileira, seja do ponto de vista da proteção social, que não pode ser reduzida ou precarizada, seja do ponto de vista do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário, que não deixa de ser um elemento importante para a garantia de manutenção da própria cobertura previdenciária. Mas que sejam examinados cuidadosamente, com amplo diálogo social, e sem que prevaleça a visão meramente fiscalista.
*Marco Aurélio Serau Junior é Mestre e Doutor em Direitos Humanos (USP) e autor de diversas obras jurídicas, dentre elas, Desaposentação – novas perspectivas teóricas e práticas (Forense, 5ª edição), Manual dos Recursos Extraordinário e Especial (Método) e Curso de Processo Judicial Previdenciário (4ª edição, Método).