Contrato de Trabalho Verde Amarelo é teste para relações entre Executivo e Legislativo
Fernando de Almeida Prado*
O ano de 2020 provavelmente irá consagrar um novo paradigma das relações de trabalho no Brasil, por meio da consolidação de importantes alterações nas relações de trabalho. Em complemento à denominada “Reforma Trabalhista”, realizada pela Lei nº 13.467/2017, neste mês de março haverá a definição sobre o Programa Verde Amarelo e, em breve, ficará clara a opção do governo para a nova modelagem das relações sindicais, por meio do avanço da Proposta de Emenda à Constituição da Reforma Sindical (PEC nº 196-A/2019).
O Programa Verde Amarelo e a Reforma Sindical servirão ainda como baliza do conflito entre o Poder Executivo e Legislativo e, sendo aprovadas, farão que o ano de 2020 marque o rompimento definitivo da modelagem trabalhista estabelecida desde a Constituição Federal de 1988.
O programa, criado pela Medida Provisória nº 905, de 11 de Novembro de 2019, busca oficialmente reduzir a taxa de desemprego (especialmente alta entre jovens, em 20,8%) e o índice de informalidade da economia como um todo (estima-se que 41,4% da população ocupada esteja em atividades informais).
O Governo Federal mira no combate ao desemprego mas talvez busque mesmo mudar o paradigma as relações de emprego: o Programa mostra a aposta do governo em criar um meio alternativo ao modelo trabalhista “CLT+FGTS”, vigente no Brasil desde 1966, por acrescentar no valor mensal do contrato as parcelas de férias, décimo terceiro e da multa rescisória sobre o FGTS.
Além disso, traz embutido em seu corpo uma nova “reforma trabalhista”, por meio de “jabutis” (matérias estranhas ao corpo da MP) que levam à alteração de 135 dispositivos da CLT, que versam sobre os mais diversos assuntos, do fim do registro obrigatório de diversas categoriais profissionais até mudança nas regras sobre PLR e sobre repouso semanal remunerado.
Por virem diretamente do Poder Executivo, muitas vezes sem efetivo debate com o Poder Legislativo, as Medidas Provisórias servem como termômetro da harmonia entre os poderes, ponto sensível neste momento. Diversos conflitos entre os poderes fizeram o Governo Federal sofrer a caducidade de diversas de suas Medidas Provisórias, e o atual momento pode atrapalhar o projeto de uma nova reforma trabalhista.
Atualmente, a MP nº 905 está prevista para ser votada por Comissão Mista do Congresso no dia 03 de março, após ter passado por intensos debates parlamentares e recebido propostas de 1.928 emendas, nos mais variados sentidos. O resultado da votação irá deixar claro até que ponto o Congresso Nacional aceita e aprova a desregulamentação das relações trabalhistas, propostas pelo governo.
Corre-se o risco tanto de sua não aprovação, que poderá perder sua validade após 20 de abril, como - na hipótese mais provável - da aprovação de um texto diverso do apresentado pelo Governo Federal, com grau maior ou menor de rejeição. O texto final da MP será uma boa medida se o liberalismo propagado pelo Poder Executivo encontra respaldo no Poder Legislativo.
Em paralelo, ainda no plano legislativo, o avanço da PEC nº 196-A/2019, que reorganiza as relações sindicais, será outro termômetro acerca da desregulamentação e enfraquecimento das atividades sindicais ou, ao menos, da presença e controle do Estado nas relações sindicais.
Apesar da Organização Internacional do Trabalho possuir regras claras e definidas acerca da liberdade sindical (Convenção 87, OIT - não ratificada pelo Brasil), a PEC nº 196-A/2019 utilizou uma “modelagem mista” para permitir a liberdade sindical no Brasil, adotando um conceito de liberdade limitada. Em prol da liberdade, retira a necessidade de autorização do Estado para funcionamento de sindicatos, mas - contrariamente - mantém o município e categorias profissionais como bases sindicais.
Com tramitação célere até o momento, a PEC está em análise por Comissão Especial, criada no início de fevereiro por ordem do Presidente da Câmara.
Historicamente, as relações de trabalho - no Brasil e no mundo - se organizam em ciclos pendulares, ora em prol da liberdade entre as partes contratantes, ora em favor da intervenção e regulamentação estatal. A facilidade de aprovação da MP nº 905 e o texto final da PEC da Reforma Sindical deixarão claro os rumos das relações trabalhistas, ao menos para a próxima década.
Havendo ampla desregulamentação e liberdade, 2020 poderá ser considerado como o ano de efetivo rompimento com o modelo constitucional de 1988, em prol de um modelo inédito na história do país.
*Fernando de Almeida Prado é advogado, professor universitário e sócio fundador do escritório BFAP Advogados