INSS tenta manobra para brecar Revisão da Vida Toda no STF

 
João Badari*
 
Em uma manobra para prejudicar milhares de aposentados e pensionistas em todo país, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão de todos os processos que discutam a “Revisão da Vida Toda” em tribunais pelo Brasil, na última segunda-feira, 13 de fevereiro.
O INSS requer que a suspensão de todos os processos ocorra após o trânsito em julgado do recurso, ou seja, após o processo estar 100% finalizado.
 
No pedido , o INSS indica que pode cumprir a decisão nos casos concretos porque as atas de julgamento já foram publicadas, mas o acórdão ainda não e as partes não foram intimadas. O INSS defende que ainda “não conhece as razões de decidir do julgamento, imprescindíveis para compreender e aplicar corretamente o entendimento firmado pelo STF a casos similares”.
 
Importante lembrar, porém, que STF em 01 de dezembro de 2022 decidiu em seu plenário presencial de forma favorável aos aposentados na Revisão da Vida Toda. 
 
É entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal a desnecessidade de aguardar a publicação do acórdão quando a decisão ocorrer por meio do seu Plenário, muito menos que se aguarde o trânsito em julgado de suas decisões para que ocorram os dessobrestamentos. O presente pedido se mostra meramente protelatório, e poderá trazer prejuízos ainda maiores para os aposentados e pensionistas, em sua maioria com idades avançadas e muitos doentes, que por décadas aguardaram o reconhecimento deste direito.
 
Como acima descrito, o entendimento consolidado da Corte é de que os precedentes firmados em Plenário possuem eficácia imediata de cumprimento nas Instâncias inferiores
 
“A Corte possui entendimento no sentido de que a existência de precedente firmado pelo Plenário autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre o mesmo tema, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do ‘leading case’. (RE 611.683-AgR/DF, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – grifos nossos)
 
Vale também destacar o ARE 909.527 com Relatoria do Ministro Luiz Fux, que em sua ementa versa sobre a desnecessidade do trânsito em julgado:
 
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. RE 855.178-RG. JULGAMENTO IMEDIATO. POSSIBILIDADE. TRÂNSITO EM JULGADO. DESNECESSIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.” (grifos nossos)
 
Para contribuir com este posicionamento citamos os ARE 940.027 com Relatoria da Ministra Rosa Weber, que dispõe: “A existência de precedente firmado pelo Plenário desta Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre o mesmo tema, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma.” e o ARE 631.091 com Relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, que possui a seguinte ementa:
 
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS. CONSTITUCIONALIDADE DA INCIDÊNCIA. ADI 2.669/DF. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTE FIRMADO PELO PLENÁRIO DO STF. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO IMEDIATO DE CAUSAS SOBRE A MESMA MATÉRIA PELOS RELATORES OU PELAS TURMAS. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
 
I - O Plenário desta Corte, no julgamento da ADI 2.669/DF, Relator para o Acórdão Min. Marco Aurélio, firmou entendimento no sentido da constitucionalidade da incidência de ICMS sobre a prestação de serviços de transporte rodoviário de passageiros.
 
II – A existência de precedente firmado pelo Pleno do STF autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre o mesmo tema, independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do leading case. Precedentes.
 
III – Agravo regimental a que se nega provimento.” (grifos nossos)
 
Em sua peça o INSS cita o sobrestamento processual trazido pelo Superior Tribunal de Justiça no tema 999, ocorre que este se deu para que ocorresse a decisão do Supremo Tribunal Federal, não havendo mais motivos para que o sobrestamento venha a ser mantido. E mais, o STJ entende que não existe necessidade de trânsito em julgado para que as decisões sejam cumpridas, conforme trazemos em seus julgados:
 
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APLICAÇÃO DE TESE FIRMADA EM RECURSO REPETITIVO. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO. IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTES. MATÉRIA EXAUSTIVAMENTE ANALISADA. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. (REsp 1.240.821-EDcl/PR, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO)”
 
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 475-O DO CPC. PREQUESTIONAMENTO. SATISFAÇÃO. RECURSO
 
REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. TRÂNSITO EM JULGADO. DESNECESSIDADE. (REsp 1.327.498-AgRg/PR, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI)” (grifos nossos)
 
As decisões de primeiras e segundas instâncias que estão retirando o sobrestamento do processo seguem o posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, onde encontramos até mesmo decisão da Corte na Reclamação 30.996, Relatoria do Ministro Celso de Mello, decidindo pela desnecessidade de publicação do acórdão ou trânsito em julgado. Segundo o relator, a jurisprudência do STF é no sentido de que, para a aplicação de decisão proferida em RE com repercussão geral, como o caso em tela, não se mostra necessário o trânsito em julgado ou eventual modulação de efeitos:
 
“Consoante entendimento jurisprudencial prevalecente no âmbito desta Corte, a circunstância de o precedente no leading case ainda não haver transitado em julgado não impede venha o relator da causa a julgá-la, fazendo aplicação, desde logo, da diretriz consagrada naquele julgamento”, explicou.
 
O Superior Tribunal de Justiça consolida o entendimento sobre a desnecessidade de trânsito em julgado para que ocorra a aplicação da decisão (AI 1.359.424-EDcl/MG, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA – AREsp 65.561-EDcl-AgRg/RJ, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO – AREsp 282.685-AgInt/CE, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO – REsp 1.280.891-AgRg-AgRg-EDcl-RE-AgInt/RJ, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, v.g.).
 
O presente pedido é uma tentativa de procrastinar o direito de quem foi lesado por uma regra de transição mais desfavorável que a permanente, ferindo a vontade do legislador e também do decidido pelas mais altas Cortes nacionais. O risco efetivo de tal suspensão seria o falecimento de muitos aposentados, que por anos aguardavam este direito, não poderem se beneficiar da decisão plenária do dia 01/12/2022.
 
Em razão da iminente publicação do acórdão, em razão do prazo regimental (artigo 95 do RISTF) de sessenta dias para a publicação automática, o INSS utiliza esta manobra processual, que busca prejudicar seus segurados. E mais, trará maior custo aos seus cofres, em razão dos atrasados a serem pagos aos que foram prejudicados e terão o benefício revisado.
 
O INSS levanta questões procedimentais internas sobre a aplicação da Revisão da Vida Toda nos casos concretos, principalmente para períodos contributivos anteriores a data de julho de 1994, porém isso já foi amplamente debatido no processo. Este tema já foi trazido nos autos, e demonstrou-se que a aplicabilidade da revisão aos aposentados prejudicados será suportada pela Autarquia. Isso é uma busca de rediscutir o que já foi.
 
*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados
 
 
 


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