Uma triste mancha ocorreu no direito previdenciário
João Badari*
O recente revés para os aposentados brasileiros marca um triste capítulo na história dos direitos previdenciários do país. Na última quinta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por anular o direito à Revisão da Vida Toda, uma medida que impacta negativamente milhares de cidadãos que dependem de suas aposentadorias para sustento. Esta decisão, fruto de duas ações diretas de inconstitucionalidade que, ironicamente, não versavam sobre o tema da revisão, revela uma manobra lamentável por parte da Corte, que resultou em um golpe duro para os beneficiários do INSS.
Aposentados lesados pelo INSS, que já tinham seu direito consolidado pela maioria de seus plenários, foram surpreendidos com uma decisão que lhes retira a dignidade e aos cidadãos brasileiros a esperança de ter assegurada a segurança jurídica das decisões da Corte.
A Revisão da Vida Toda é uma importante medida que visa corrigir distorções no cálculo das aposentadorias, levando em consideração todos os salários de contribuição ao longo da vida laboral do segurado. Essa revisão é especialmente relevante para aqueles que tiveram períodos de contribuição em que seus salários eram mais altos do que os registrados nos últimos anos antes da aposentadoria. Para muitos aposentados, essa correção significaria um aumento em seus benefícios, garantindo uma renda mais condizente com sua trajetória de trabalho e contribuição para a previdência social. Na prática, significava sacolas de mercado com alimentos e compras de medicamentos.
No entanto, a decisão do STF de anular esse direito representa um retrocesso preocupante, que coloca em xeque a segurança jurídica dos direitos previdenciários no Brasil. Ao negar aos aposentados a possibilidade de terem suas aposentadorias recalculadas de acordo com toda sua vida laboral, o tribunal ignora não apenas os princípios da justiça social, mas também a própria legislação brasileira.
A situação é ainda mais preocupante quando se considera as declarações infelizes do ministro Flávio Dino, que afirmou que não existe na legislação brasileira a possibilidade de computar todos os salários de contribuição da vida laboral. Tal afirmação demonstra um total desconhecimento não só da legislação vigente, mas também das emendas constitucionais pertinentes ao tema.
Bradou em alto e bom som o novo ministro, que jamais a legislação previdenciária permitiu o cômputo de todos os salários de contribuição. Mas sabia ele que hoje o cálculo se faz desta maneira? Sabia ele que a lei que estava julgando, também assim o estipulava? Um desconhecimento inexplicável, sobre um tema tão relevante.
De fato, a Lei 9876 e a Emenda Constitucional 103 estabelecem claramente que o cálculo do benefício previdenciário deve levar em conta toda a vida contributiva do segurado. Portanto, a fala do ministro Dino não apenas contradiz a legislação existente, mas também desinforma os Ministros e a população sobre seus direitos previdenciários, gerando ainda mais incerteza e insegurança jurídica.
A luta por uma previdência justa e equitativa não pode ser interrompida por decisões arbitrárias e desinformadas. É preciso trazer as autoridades competentes a reverem essa decisão e garantirem que os direitos dos aposentados sejam respeitados e protegidos.
E aqui trazemos uma irresponsável e irreal conta apresentada pela União ao STF, com um custo inverídico de R$ 480 bilhões, sendo que o impacto não chegaria em R$ 3 bilhões no prazo de 10 anos. Até quando o Supremo vai aceitar esta estratégia desleal do governo em emplacar números inflados, para criar um terrorismo atuarial e com isso retirar o direito dos cidadãos lesados?
Além disso, é necessário um debate público mais amplo sobre a importância da Revisão da Vida Toda e sobre a necessidade de garantir uma Previdência Social que atenda verdadeiramente às necessidades dos trabalhadores brasileiros. Somente através da conscientização e da mobilização social será possível reverter esse triste episódio e construir um sistema previdenciário mais justo e inclusivo para todos.
Que a sociedade se mobilize por este direito do aposentado, como a mobilização em plenário trazida pelo Presidente Luís Roberto Barroso, para que o seu voto vencido na Revisão da Vida Toda, pudesse prevalecer em duas ações distintas, onde nem mesmo estes eram os pedidos da ação.
Como brilhantemente defendeu o relator, ministro Alexandre de Moraes, são aposentados que apenas buscam ser tratados como os demais, aplicando em seus casos a regra permanente de aposentadoria. Isso não é ser tratado com vantagens, e sim que seja respeitada a lei e a vontade do legislador. E mais, respeito a decisão consolidada pelo Tribunal, com a pseudo defesa de economia aos cofres públicos.
Uma triste mancha no direito dos trabalhadores e aposentados do Brasil, que tinham a esperança em uma justiça imparcial.
*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados