A aposentadoria especial dos médicos segue preservada, mesmo após a Reforma da Previdência

 
João Badari*
 
O Dia do Médico, celebrado em 18 de outubro, é uma data dedicada a homenagear os profissionais que cuidam da vida e da saúde de milhões de pessoas no Brasil e no mundo. Os direitos previdenciários dos médicos são garantias que esses profissionais têm em relação à aposentadoria, benefícios por incapacidade, pensões e outras proteções oferecidas pela previdência social no Brasil. Esses direitos variam conforme o regime de contribuição no qual o médico está inserido, seja no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ou no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), aplicado aos servidores públicos.
 
Entre consultas, plantões e cirurgias, os médicos enfrentam diversas situações nas quais estão expostos a condições insalubres, o que lhes dá acesso à aposentadoria especial ou à conversão do tempo especial em comum. Esse direito é garantido àqueles que trabalham diariamente em contato com agentes biológicos, uma realidade desafiadora que impacta profundamente a saúde desses profissionais. Um exemplo é o caso de meu pai, médico no serviço público, que contraiu Covid-19 durante um plantão. Após 71 dias na UTI, ele perdeu permanentemente a mobilidade nas pernas.
 
A aposentadoria especial oferece um benefício importante: a possibilidade de se aposentar sem idade mínima e sem a aplicação do fator previdenciário, desde que o profissional tenha completado 25 anos de serviço. No entanto, esse direito é válido apenas para quem cumpriu esse tempo até 13 de novembro de 2019, data em que entraram em vigor as novas regras da Reforma da Previdência, mesmo que o pedido de aposentadoria seja feito posteriormente.
 
Outro cenário comum é o do médico que não dedicou toda a carreira a atividades insalubres, mas deseja converter parte desse tempo especial em comum. Embora a Reforma da Previdência tenha proibido a conversão de tempo especial para períodos trabalhados após 13 de novembro de 2019, ainda é possível converter o tempo anterior à reforma.
 
Um exemplo é o da doutora Ana Carolina, que solicitou sua aposentadoria em julho de 2024, após 20 anos como médica. Ela possui o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), documento que comprova a exposição habitual a agentes nocivos. Ana Carolina poderá converter o tempo insalubre anterior a 13 de novembro de 2019 em comum, com um fator de conversão de 1,2, o que acrescentará três anos ao seu tempo total de contribuição, atingindo 23 anos. O tempo posterior a essa data será contado como comum, sem acréscimo.
 
Se Ana Carolina tivesse completado 25 anos de atividade médica antes de 13 de novembro de 2019, o direito adquirido prevaleceria: mesmo que o pedido de aposentadoria fosse feito agora, ela poderia se aposentar pelas regras antigas, sem o fator previdenciário, e as 20% menores contribuições seriam desconsideradas no cálculo do benefício.
 
Com a Reforma da Previdência, as regras para a aposentadoria especial tornaram-se mais rígidas. Agora, é exigida uma idade mínima, além de ter sido eliminada a possibilidade de converter tempo especial em comum para períodos após 13 de novembro de 2019. No entanto, foram criadas regras de transição que aliviam o impacto dessas mudanças.
 
Os profissionais filiados ao RGPS antes da reforma, mas que não cumpriram os requisitos até 13 de novembro de 2019, podem se aposentar pelas regras de transição, que exigem a soma de pontos (idade + tempo de contribuição), conforme o tempo de exposição a agentes nocivos:
 
66 pontos e 15 anos de exposição efetiva;
76 pontos e 20 anos de exposição efetiva;
86 pontos e 25 anos de exposição efetiva.
 
No caso dos médicos, que geralmente precisam de 25 anos de trabalho insalubre, a regra de transição exige 86 pontos. Para a regra permanente, é necessário que o médico tenha ao menos 60 anos de idade e 25 anos de contribuição.
 
Uma dúvida comum entre os profissionais de saúde é: se eu me aposentar de forma especial, poderei continuar trabalhando?
 
Em 2020, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 709, decidiu que não é permitido continuar em atividades insalubres após a aposentadoria especial. Se o médico continuar exercendo funções que coloquem sua saúde em risco, o benefício previdenciário será cessado.
 
No entanto, há algumas alternativas:
 
O médico pode continuar trabalhando, desde que a função não envolva exposição permanente a agentes insalubres. Ele pode atuar em outras áreas da medicina que não apresentem riscos constantes à saúde.
 
Se a aposentadoria for por tempo de contribuição ou por idade, com parte do período especial convertido em comum, ele poderá continuar exercendo a medicina normalmente.
 
Já a aposentadoria dos médicos do RPPS, ou seja, médicos servidores públicos, tem regras específicas que variam conforme o ente federativo (União, estados ou municípios). A idade mínima de aposentadoria no RPPS é de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens, com tempo mínimo de contribuição de 25 anos, sendo 10 anos de serviço público e 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria. Também há regras de transição para servidores que ingressaram antes da Reforma da Previdência.
 
Por fim, para os médicos que já se aposentaram, pode ser interessante realizar uma revisão do benefício, pois há casos em que as contribuições não foram corretamente consideradas, o que pode resultar em um aumento judicial no valor da aposentadoria.
 
*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
 


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