STF inicia julgamento que pode limitar execução trabalhista ao valor da causa
Cíntia Fernandes*
O Supremo Tribunal Federal julgará, nos próximos dias, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6002, proposta em 2018 pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A ação impugna a constitucionalidade de dispositivos da Reforma Trabalhista que impõem ao trabalhador a obrigação de indicar, já na petição inicial, valores certos e determinados para cada pedido — exigência introduzida pelos §§ 1º e 3º do artigo 840 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O julgamento, em plenário virtual, está previsto para terminar no dia 3 de novembro.
A Corte decidirá se os valores indicados na petição inicial devem ser compreendidos como limites fixos da condenação, que não poderiam ser superados na sentença, ou como estimativas iniciais, passíveis de revisão posterior na fase de liquidação, quando os cálculos são definidos com base nas provas produzidas no processo.
A OAB sustenta que a regra introduzida pela Reforma Trabalhista restringe o acesso à Justiça, ao exigir do trabalhador a fixação de valores antes mesmo de ter acesso a documentos e informações que, em regra, estão sob a posse do empregador, condição indispensável para a correta apuração dos créditos devidos.
Nesse sentido, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já consolidou o entendimento de que os valores atribuídos na inicial têm caráter meramente estimativo, admitindo condenações superiores quando comprovadas na fase de liquidação. Ainda assim, alguns tribunais vêm limitando a condenação e a execução ao valor atribuído à causa, impondo uma espécie de liquidação prévia incompatível com a natureza célere e informal do processo trabalhista.
O valor estimado cumpre função apenas delimitadora e não pode ser interpretado como renúncia ou limitação de crédito. Em matéria trabalhista, de natureza alimentar e essencial à justiça social, vincular a execução ao valor da causa contraria a lógica protetiva do processo do trabalho e afronta os valores constitucionais da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho e da justiça social, previstos nos artigos 1º, incisos III e IV, 6º e 7º da Constituição Federal.
O julgamento do STF será decisivo para definir se a exigência de liquidação imposta pela Reforma Trabalhista deve ser interpretada em consonância com os princípios constitucionais do acesso à Justiça e da proteção ao trabalhador, ou se poderá, ao contrário, restringir materialmente a reparação integral de créditos de natureza alimentar.
*Cíntia Fernandes é advogada especialista em Direito do Trabalho e sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados
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